Esse é o post mais antigo da nossa viagem pela América do Sul. E eu o guardei porque queria publicá-lo com carinho, mas passou tanto tempo e agora eu quero falar sobre o que me moveu a fotografá-las.
As animitas são as homenagens que os chilenos crentes fazem para pessoas que faleceram em espaço público. Há animitas na beira das estradas e dentro das cidades. Famílias homenageam seus entes queridos no local de sua morte, colegas de trabalhos homenageam falecidos em acidentes nas minas. Com o tempo, algumas dessas animitas viram verdadeiros lugares de adoração, mausoléus, crescendo em tamanho, em objetos ofertados, com objetos de valor afetivo de quem passa e o oferece e também em importância para quem crê.
Animita é o diminutivo de alma, em espanhol, anima. A cultura dita que a pessoa que morreu de maneira trágica, fica com a alma presa na Terra, mas tem uma conexão com o divino, razão pela qual fazer pedidos, deixar presentes e agradecimentos faz todo sentido. Continue reading “Animitas (Chile)”
Durante esse tempo que passei sem postar, algumas vezes me lembrava do blog com uma certa culpa. As imagens e os posts estavam criados, com títulos, só faltando escrever os textos. Abria a parte administrativa do site e pensava no que escreveria, depois deixava “prá mais tarde”, acabava esquecendo, absorvida pelas atividades do dia a dia, pelos cuidados com a Maya, por nossas mudanças, pela vida…
Ontem enviei um projeto para a prefeitura da pequena cidade onde moramos (pois é, estamos no Brasil, faz um ano já) e incluí um link para o blog, o que me fez entrar no site, ler alguns posts, lembrar das fotos já incluídas nos posts não escritos e não postados.
Sei que não me lembro de todos os detalhes daquela viagem e que mudei nesses anos que passaram, mas as fotos merecem ver a luz do dia. E algumas histórias merecem ser contadas, ainda que sob novos ângulos.
Ontem, por coincidência, estava assistindo a um documentário com o João Bittar, o fotojornalista brasileiro, morto em 2011. Em algum momento ele diz que algumas fotos foram feitas para serem vistas depois, até 30 anos depois, ele disse. Será que é o caso das minhas? De qualquer maneira, é interessante rever trabalhos antigos, pensar em quem você era naquele momento, perceber que amadureceu, sentir saudades, sentir gratidão pelas mudanças internas, perceber que faria muita coisa diferente.
E o que fiz nesses anos que se passaram? Principalmente cuidei da Maya, minha filha de 3 anos e pouco. E cuidei de mim, das minhas ideias. Moramos por 2 anos em Nova Iorque, fizemos várias viagens pelo Brasil buscando um lugar para morar, fiz um curso sobre plantas medicinais, alguns cursos rápidos de culinária natural, fotografei (principalmente a Maya) e, no ano passado, voltamos ao Brasil, para morar na Serra da Mantiqueira. Deletei minha conta no Facebook e assisti muitos filmes e seriados.
Em Nova Iorque, deixei nossa sacada sem espaço, com as plantas que fui semeando ou comprando, ainda por lá, mudamos para uma casa e enchi o jardim com mais plantas (que morriam no inverno e voltavam na primavera). Quando chegamos na Serra, voltei a plantar. Depois vieram as galinhas. E os pintinhos. Depois o terreno, que compramos faz uns meses e para onde queremos nos mudar, montar nossa base. Com a casa pronta, queremos voltar a viajar, daqui uns anos. Construímos esse ninho, que é nossa família. Li muito sobre educação. Pensei muito sobre educação. Falei muito sobre educação. Virei a chata da educação. Superei. Virei a mãe que sou hoje, e a mulher que sou hoje, de quem gosto muitíssimo.
Espero que gostem do que lhes reservo, os queridos leitores que ainda estejam por aqui. :)
É uma pena que não escrevi antes sobre Santiago de Okola, porque tenho certeza que alguns detalhes me escapam. Mas se fosse escrever esse post 4 anos atrás, ele teria sido mais ingênuo, menos consciente.
A pequena comunidade de Santiago de Okola é extremamente pitoresca, à beira do Titicaca boliviano. Produzem seu próprio alimento, com cada família sendo responsável por uma parte da produção (batatas e outros tubérculos, quinoa e outros cereais, porcos, ovelhas, patos, eles produzem produtos têxteis também, a partir da lã das ovelhas que criam). Queria sentir a vida andina sem os inevitáveis filtros para turistas, queria a experiência de morar à beira do Titicaca, de entender plenamente como vivem os locais. Ambiciosamente, queria me sentir local. Talvez esse seja um dos meus maiores amadurecimentos ao longo dos anos que se seguiram à nossa experiência pela América do Sul. Esse anseio impossível por sentir como o outro se sente sem sê-lo. Sem a língua, a cultura, as experiências, a perspectiva. Continue reading “Santiago de Okola (Bolívia)”
Viver é muito perigoso… Porque aprender a viver é que é o viver mesmo… Travessia perigosa, mas é a da vida. Sertão que se alteia e abaixa… O mais difícil não é um ser bom e proceder honesto, dificultoso mesmo, é um saber definido o que quer, e ter o poder de ir até o rabo da palavra.
Guimarães Rosa
“Pegar estrada” é sujeitar-se ao desconhecido, não só o desconhecido do mundo que se abre, mas também ao desconhecido dentro de si. Abandonar as certezas não é sempre uma decisão fácil. Mesmo tendo um comprometimento grande de encontrar respostas interessantes para as várias questões da minha vida, muitas vezes, diante da necessidade do novo, sou a primeira a relutar, a me recusar a aceitar as mudanças que eu mesma quis.
Quando começamos esta jornada, em maio de 2012, não sabíamos onde íamos parar, nem quando. Nossa plano inicial era ficar seis meses viajando, plano que rapidamente se mostrou inviável: nenhum de nós dois tem fôlego para ver tudo o que queríamos ver, em tão pouco tempo. Logo em seguida, um ano na estrada parecia tempo de menos e tempo de mais. Explico: de menos para ver tudo, conhecer as pessoas, nos aprofundar. De mais, para o Rodrigo ficar longe do mercado de trabalho (ele já tinha se desvinculado da última empresa em que trabalhou uns bons meses antes da viagem, quando já sabíamos que íamos viajar).
Freirina é o nome de um pequeno povoado situado na província de Huasco, no chamado “pequeno norte” do Chile. Fundado em 1752, é uma das localidades mais antigas da região. Reúne atualmente cerca de 5 mil habitantes, apenas. Fica na província de Huasco banhada pelo rio de mesmo nome, na III Região de Atacama. O clima é semi-desértico costeiro, sofrendo influências do deserto e do oceano. A população vive da agricultura (cultivo de oliveiras para fabricação de azeite e azeitonas para consumo local e exportação), pesca e turismo. Influenciada pelo Pacífico, a região floresce na primavera: a paisagem árida dá lugar ao deserto florido. Continue reading “Freirina e os Porcos”
Interrompo a narrativa de nossa passagem pela América do Sul para escrever sobre Minas Gerais, uma viagem que aconteceu no final de dezembro de 2011.
Quando voltamos de lá, guardei as fotos e por fim, esqueci delas. Hospedados, então, num pequeno hotel no meio do mato no mês passado, numa madrugada de insônia, aqui na Bolívia, resolvi editá-las. Olhar estas fotos – que agora compartilho com vocês – me fez pensar nestes dias de estrada, quando ainda tínhamos casa.
Para Minas, não tínhamos um roteiro totalmente definido, mas em nosso plano original, tentaríamos conhecer as diversas regiões deste estado que é o quarto maior em extensão territorial e o segundo mais populoso no Brasil. Com o carro cheio de amenidades, comida, fogareiro, barraca, roupas saímos de São Paulo em direção a Rodovia Fernão Dias e nosso primeiro destino: um motel de beira de estrada entre Três Corações e São Tomé das Letras. Continue reading “Minas Gerais!”
Em 3 de Outubro, no mesmo dia das eleições, a FLM (Frente de Luta por Moradia), ocupou 4 prédios vazios no Centro da cidade de São Paulo.
Frequentei o prédio ocupado na Avenida Ipiranga durante o período em que eles ficaram por lá. Com eles conversei, fiz perguntas, comi e por lá dormi na última noite, a noite da reintegração de posse.
Com eles consegui aprofundar meu questionamento sobre a moradia em grandes cidades especialmente uma com tanto espaço físico como São Paulo, que ainda que tão grande, constantemente empurra seus moradores com menor poder aquisitivo para longe, para as periferias da cidade, através de demolições seguidas de construções de prédios de luxo ou destinados a classe média, altas no valor dos imóveis, especulação imobiliária e tantas outras questões relacionadas ao custo de vida.
Como eu estava colaborando com o Outras Palavras (outraspalavras.net) num site sobre a ocupação, o Breno, que também colabora com o Outras, me ofereceu uma parceria na matéria dele que ia sair no Uol. Topei e 18 fotos foram publicadas, junto com a matéria que ele escreveu. Uma matéria super boa, aliás!