Depois de passar uns dias no Valle del Huasco, conhecendo a região e pesquisando para o artigo sobre mineração, seguimos pela Ruta 5, a principal rodovia aqui no Chile (que corta o país de norte a sul), para um pequeno vilarejo na costa chamado Carrizal Bajo.
Uma amiga, brincando, nos disse que o lugar deveria se chamar Bizarro Bajo, porque era estranho. Fomos ver com nossos próprios olhos.
Chegamos à noite, e rapidamente encontramos uma hospedagem barata no andar superior de um restaurante onde homens comiam e conversavam tomando vinho barato. Para pagar menos, aceitamos um quarto com uma cama de solteiro, o banheiro ficava em outro quarto, desocupado. E uma varanda com vista para o mar.
Tínhamos um vinho aberto na noite anterior. Terminamos a garrafa e fomos dormir. O gerador parou de zumbir às 23h. Escuro e silêncio se instalaram. Noite desconfortável, sem espaço, a cama era tão pequena que desconfiamos que fosse menor que nossa já minúscula barraca de uma pessoa.
O dia seguinte amanheceu nublado. Saímos no vento frio para caminhar. A cidade misteriosa abria suas ruas para nós. Mas não suas casas. E muito menos suas pessoas. Vimos pouca gente, só uma criança. A calmaria imprimia uma atmosfera assustadora. Carros e ônibus enferrujados abandonados. Com fome e frio, voltamos ao quarto para cozinhar nosso almoço.
Ficamos mais uma noite. Eu queria fotografar.
O próximo dia nos acordou ensolarado e o ar de mistério dissolveu-se com os raios do sol. Caminhamos pelos mesmos lugares do dia anterior, vendo a cidade com outros olhos. As casas permaneciam fechadas, mas atrás de uma cerca, alguém ouvia reggae e fumava maconha. Pescadores lidavam com seus barcos ao longe e um fotógrafo fotografava a fachada de uma loja. Já não estávamos sós.
Este pequeno vilarejo teve sua importância na luta contra o governo de Pinochet: era para lá que o grupo guerrilheiro Frente Patriótico Manuel Rodriguez armazenava armas de calibre pesado enviadas pelo governo fidelista. O povoado chegou a abrigar cerca de 80 toneladas de material bélico. O esconderijo foi descoberto em agosto de 1986, um mês antes de Pinochet sofrer um atentado em Cajón del Maipo que deixou 5 mortos e 11 feridos.
Hoje o povoado, iluminado por gerador e placas de energia solar, é ao mesmo tempo a segunda casa (como chamam aqui as casas de veraneio) de moradores dos vales da região e uma vila de pescadores.
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